domingo, 6 de dezembro de 2015

Gabriele Basilico, Beirut, 1991.
(PT)

Doem-me os braços
Disse três vezes à mulher que me doem os braços
Mas não acredita

Não acredita que andei por estradas
Sem rumo, por estradas
Vagueando por interstícios, por estradas
Pé firme no peito da terra
Emigrado de mundo

Foi este o meu êxodo
Por campos de papoilas
Correria na fuga à podridão
Eu e os que acreditavam poder mudar o mundo
Com um beijo quase inócuo.

(ES)

Me duelen los brazos    
Dijo tres veces a la mujer me duelen los brazos
Pero no se lo cree

No cree que he andado por carreteras
Sin rumbo, por carreteras
Vagueando por intersticios, por carreteras
Pie firme, en el pecho de la tierra
Emigrado de mundo

Esta fue mi éxodo
Por los campos de amapola
Una carrera en la fuga a la putrefacción
Yo y los que creíamos que podíamos cambiar el mundo
Con un beso casi inocuo.


quinta-feira, 15 de outubro de 2015

El fantasma de la ópera (Gastón Leroux), 1910
(PT)
Com um beijo quase inócuo
escondi nos seus lábios
a espuma dos dias.

Assombrada fugiu da vertigem:
memória da lembrança
anúncio do esquecimento.

Não posso negar:
O teu tronco é um estremecimento mudo da terra

(ES)
Con un beso casi inocuo,
escondí en sus labios
la espuma de los días.

Asombrada huyo del vértigo:
memoria del recuerdo
anuncio del olvido.

No puedo negar:
Tu tronco es un silencioso temblor de la tierra

segunda-feira, 10 de agosto de 2015


'no topo da unité d'habitation', Marselha.

(PT)
o teu tronco é um estremecimento mudo da terra

por certo a noite limpa
traz a invenção de um sonho novo
a buganvília como um nómada vagaroso
as colinas a lembrar que os dias
não mais serão afluentes de seca
floriram já
quando o sorriso das crianças 


selaste os meus lábios com um beijo

(ES)
tu tronco es un silencioso temblor de la tierra

por cierto la noche limpia
trae la invención de un sueño nuevo
la buganvilla como un nómada sin prisa
las colinas para recordar que los días
no serán más afluentes de la sequia
han florido ya
cuando la sonrisa de los niños 

sellaste mis labios con un beso

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Casablanca (Michael Curtiz), 1942
(PT)
Selaste os meus lábios com um beijo
E nunca mais pudeste sair.
Apenas um
E te fizeste eterna

Escuto em silêncio
a tua sombra na minha cabeça.
É hora de despertar.
Pensas que só os pássaros podem voar?
Sobe-te comigo.
Vou levar-te a um lugar.

Recordo a imensidade do teu beijo.
Do teu cheiro.
Do teu corpo.
Do teu sorriso.
Da forma eterna com que me olhas.
De tudo o que me faz sentir-te tão perto
e me condena ao saber-te tão longe.

Demasiado tarde
para esquecer.
Perdi-me na retorica
dos signos que te escondi.
Precipita-se a dúvida:
Não sei como vieste.



(ES)
Sellaste mis labios con un beso
y nunca más pudiste salir.
Apenas uno
y te hiciste eterna.

Escucho en silencio
tú sombra en mi sien.
Es hora de despertar.
¿Piensas que solo los pájaros pueden volar?
Súbete conmigo.
Te llevo a un lugar.

Recuerdo la inmensidad de tu beso.
De tu olor.
De tu cuerpo.
De tu sonrisa.
De la forma eterna con que me miras.
De todo lo que me hace sentirte tan cerca
y me condena al saberte tan lejos.

Demasiado tarde
para olvidar.
Me perdí en la retorica
de los signos que te escondí.
Se precipita la duda:

No sé cómo viniste.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

D. A. Harvey BRAZIL. Bahia. 2002
(PT)

não sei como vieste
mas esta noite sonhei que voltava a ver-te
o sorriso como uma rua alegre,
a aura intacta de quem sabe.

por aí arde a cidade
já o vi no noticiário
a favela num chinfrim
voltada para as estatuetas fluorescentes da virgem
a  retoma da chacina por respostas
indigente insaciável de palavras.

(ES)

no sé cómo viniste
pero esta noche he soñado que volvía  a verte
la sonrisa como una calle alegre,
el aura intacta de quien sabe.

Por ahí arde la ciudad
ya lo vi en el telediario
la chabola en alborozo
de frente a las estatuillas fluorescente de la virgen
la retoma de la matanza por respuestas
indigente insaciable de palabras

sábado, 23 de maio de 2015




The Gold Rush (1925), Charles Chaplin


(PT)

Indigente insaciável de palavras
Deixas pegadas no silêncio.
Preparas a tua ausência.

Disparas um sorriso
Com a inocência indiscreta
Do teu olhar.
Escondes os teus sinais,
Envolvidos em gestos e parágrafos.

Não me deixes
uma nota na retina!

Assombra o teu corpo
Na ansiedade dos meus lábios
E recorda o cheiro das minhas mãos.

Não me condenes.
Se os meus gestos denunciam pecado.

Busca-me no incerto do ocaso
E quando não saibas de mim
Pergunta ao indigente insaciável de palavras
Ele te dirá:
- Dizem por aí que a as suas mãos curam.

(ES)

Indigente insaciable de palabras.
Dejas huelas en el silencio
Planteas tu ausencia.

Disparas  una sonrisa
con la inocencia indiscreta
de tu mirada.
Esconde tus señales,
envueltos en gestos y párrafos.

¡No me dejes una nota
en la retina!

Asombra tu cuerpo
En la ansiedad de mis labios
Y recuerda el olor de mis manos.

No me condenes.
Si mis gestos denuncian  pecado.

Búscame en el incierto del ocaso.
Y cuando no sepas de mí
Pregunta al indigente insaciable de palabras.
El te dirá:
- Dicen por ahí que sus manos sanan.





segunda-feira, 11 de maio de 2015

Death of a loyalist militiaman; Robert Capa, Spain, 1936. 
(PT)

dizem por aí que a as suas mãos curam
o céu brada que as pedras lhe obedecem
que fala o idioma das aves
e controla a violência dos ventos

não foram raras as vezes
interpelava-o sempre antes de adormecer:
-ei! sim, tu! olha-me para estes desgraçados
a matarem-se de fome, de raiva, de ódio
a aniquilarem as searas
a borrarem as tuas pinturas
os teus mares

ria sempre.
uma gargalhada rasgada de quem transige
de quem sabe que o abismo
é ainda uma droga leve
vazio. oco. oposto.

(ES)

Dicen por ahí que sus manos sanan
el cielo clama que las piedras le obedecen
que habla el lenguaje de los aves
y controla la violencia de los vientos

no fueron raras las veces
lo interpelaba siempre antes de caer dormido:
-hey! sí, tu! mira estos desgraciados
matándose de hambre, de ira, de odio
aniquilando los campos
borrando tus pinturas
tus mares

reía siempre.
una carcajada rasgada de quien traspasa
de quien sabe que el abismo
todavía es una droga leve

Vacío. Oquedad. Reverso.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Aniki Bobó - Manuel de Oliveira (1942)

(PT)

Vazio. Oco. Oposto.
Não ficou nada por dizer.
Saiu disparado
investindo contra a própria sombra.

Sabia que nunca poderia esquecer.
Tinha esse estranho jeito
de transformar o esquecimento em saudade.

Levou a silhueta ébria
para um refúgio distante
fugindo de um feitiço segredado.

Um fragor ameaçou o seu silêncio,
e o fantasma soprou sonhos caducados.

Já não há cordura
que apazigue o desencanto.
Só ficou o céu ocre
neste lugar de chuvas

 (ES)

Vacío. Oquedad. Reverso.
No quedó nada por decir.
Salió disparado
invistiendo contra su sombra.

Sabía que jamás podría olvidar.
Tenía esa extraña costumbre
de transformar el olvido en recuerdo.

Llevó la silueta ebria
para un refugio lejano
huyendo de un hechizo murmurado.

Un estallido amenazó su silencio,
el fantasma sopló sueños caducados.

Ya no hay cordura
que apacigüe el desencanto
solo queda el cielo ocre
en este lugar de lluvias